O baque da greve dos caminhoneiros sobre a economia nacional e a volatilidade nos mercados globais colocaram em xeque a recuperação do setor de fundos de investimentos imobiliários (FIIs). Por outro lado, o cenário adverso abriu um filão para o aplicador, que consegue desembolsar menos pelo investimento, obtendo no final a mesma rentabilidade.
Os FIIs são investimentos de renda variável e negociados como ações, mas, em vez de empresas, o aporte é em imóveis. Dentro do fundo, cada investidor tem uma cota correspondente ao montante aplicado, que rende um valor todo mês, daí a semelhança com a renda fixa. Ao dividir o preço da cota pelo valor patrimonial do fundo, é possível se ter uma ideia de quanto as pessoas estão dispostas a investir.
Em maio, praticamente todos os dez fundos mais negociados no Brasil, segundo a B3, ficaram com suas cotas em baixa. Diante de uma crise, como a da paralisação dos caminhoneiros, os cotistas que querem sair dos fundos entram em pânico e tendem a jogar para baixo o preço da cota no mercado. Mas o valor da renda mensal – obtida com os contratos que existem dentro do fundo, se mantém, já que eles são de longo prazo. “É mais ou menos como ocorre na economia real, você não vê inquilinos cancelando contratos por conta de um evento como uma greve”, explica Rodrigo Cardoso, sócio fundador do Clube FII.
Outro fator que pressiona o valor das cotas dos fundos é a alta dos juros futuros, que aponta como deverá estar a taxa Selic lá na frente. A relação entre o preço das cotas dos fundos e os juros é inversa, explica Arthur Vieira, professor de finanças da Fecap. Com a tendência de juros mais altos, os títulos de renda fixa ficam mais atrativos. Como nos FIIs não é possível mexer na renda mensal, já fechada por contratos de aluguéis ou papéis atrelados ao setor, o preço das cotas tem de baixar para oferecer um prêmio melhor e atrair mais investidores. Na prática paga-se menos pelo mesmo retorno.
Com esses dois movimentos favoráveis à entrada, o número de investidores subiu mais de mais de 20% entre janeiro e maio. No primeiro mês do ano havia 125,8 mil investidores. Em maio já eram 155 mil, patamar mais alto desde 2010, segundo dados divulgados pela B3.
“Mais investidores traz mais liquidez ao mercado e quem entra olha mais pra renda do que para a possibilidade de a cota diminuir. Ele quer o retorno no longo prazo e não no curto”, diz Vieira, da Fecap.
Riscos. Vieira faz uma ressalva que o cenário incerto tanto no Brasil quanto lá fora não é tão favorável a fundos “de papel”, que só possuem títulos de recebíveis e não aluguéis físicos, como CRIs e LCIs, pois o risco de calote aumenta.
Anita Scal, sócia da Rio Bravo, explica que os fundos imobiliários que aplicam diretamente em imóveis reais, os “fundos de tijolos”, resistem melhor a esses períodos mais turbulentos por causa dos contratos de longo prazo. Dentro dessa categoria, os de aluguéis em agências bancárias e shoppings, que tem renda não só de lojas, mas de estacionamentos, por exemplo, tendem a se sair melhor. Já os que aplicam em lajes corporativas e galpões também estão mais vulneráveis.
Novos fundos. O setor começou o ano em um ritmo crescente de captação e ofertas de novos fundos, mas a virada no cenário macroeconômico reduziu o apetite das novas emissões, como fez com as cotas.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) registrou 25 ofertas de novos fundos neste ano até 13 de julho – considerando novos FIIs e ofertas subsequentes –, um movimento que apontava para expansão frente aos anos de 2017 (27), 2016 (12) e 2015 (10).
As 25 ofertas buscam levantar um teto de R$ 7,8 bilhões junto aos investidores. Até aqui, 14 foram encerradas, com arrecadação de R$ 3,15 bilhões, nem metade do montante projetado.
O FII XP Log (fundo de galpões logísticos da XP Gestão de Recursos) encerrou a captação em 5 de junho, em meio à crise dos caminhoneiros, e obteve R$ 366 milhões, o que corresponde a 45% do teto de R$ 805 milhões. Já o FII Pátria Edifícios Corporativos, que visava até R$ 500 milhões, chegou a prorrogar o prazo da oferta, sinalizando que a atração de investidores estava mais difícil.
“A perspectiva do primeiro trimestre era positiva para captações no mercado. A partir de maio, o clima doméstico começou a se complicar e o cenário internacional piorou bastante”, observa o sócio do BTG Pactual, Allan Hadid. O executivo cita o agravamento das incertezas políticas, a desvalorização cambial e a elevação dos juros futuros como os principais razões para a queda no fluxo de recursos para as ofertas. “O mercado está mais seletivo. Ficou difícil para os fundos com gestores menos conhecidos e operações (tipos de ativos) menos triviais”, diz.