Oferecido no Brasil desde 2006, o crédito com garantia em imóveis, o chamado "home equity", pode ganhar novo salto com a entrada das start-ups financeiras ("fintechs") nesse mercado, que movimenta cerca de R$ 15 bilhões, dos quais 70% estão nas mãos dos bancos. As fintechs Bcredi, do grupo Barigui, Creditas e Cash Me, da Cyrela, começaram a oferecer essa modalidade de crédito, que funciona como uma linha de empréstimo pessoal ou de capital de giro para micro e pequenos empresas, com garantia em um imóvel.
A vantagem das novas plataformas é a possibilidade de dar escala para o produto, permitindo redução dos juros cobrados nessas linhas e maior agilidade na contratação do empréstimo.
Embora algumas empresas tenham operado essas linhas no passado, o modelo de negócio era muito parecido com o dos bancos e baseado na oferta de crédito aos clientes por meio de lojas físicas, o que trazia um custo mais alto para a operação. Esse foi o caso da BM Sua Casa, adquirida pelo Banco Pan e depois descontinuada.
Hoje, além do modelo digital, a queda da taxa básica de juros abriu espaço para a atuação das fintechs, ao tornar o mercado de capitais uma fonte vantajosa de captação de recursos para expandir suas carteiras.
O potencial de desenvolvimento desse mercado no Brasil é muito grande. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE mostram que há cerca de 69,8 milhões de domicílios. Desse total, 68% dos imóveis estão quitados e poderiam ser usados em operações de refinanciamento. "Estimamos que em dez anos o mercado de crédito com garantia em imóvel deve alcançar entre R$ 80 bilhões a R$ 100 bilhões", diz Paulo Gonçalves, diretor de finanças e relações com investidores da Cyrela.
Ainda assim é um volume muito pequeno quando comparado a mercados mais maduros como o americano. "Nos Estados Unidos, o mercado imobiliário soma US$ 13 trilhões e cerca de um terço desse volume é de home equity", diz Maria Teresa Fornea, presidente da Bcredi.
Com mais de dez anos de experiência na oferta de crédito com imóvel em garantia, o grupo Barigui, que acumula R$ 600 milhões em empréstimos nessa linha, decidiu investir na popularização e modernização da modalidade com o lançamento da fintech Bcredi. A nova empresa já originou R$ 35 milhões, sendo R$ 18 milhões somente neste ano.
"O nosso foco é o pequeno empresário, com faturamento entre R$ 50 mil e R$ 2 milhões, que busca essa linha como alternativa para o capital de giro ou que quer expandir seu negócio", diz Maria Teresa. O financiamento, cujo tíquete médio varia de R$ 150 mil a R$ 180 mil, é limitado a 50% do valor do imóvel com prazo de até 15 anos.
A construtora Cyrela também está entrando nesse mercado. O grupo criou uma fintech, a CashMe, que oferece crédito com garantia em imóvel no valor de até 70% do bem. "Temos R$ 250 milhões em home equity e carteira de terceiros [fora da construtora]", diz Gonçalves.
Segundo o executivo, o diferencial da plataforma de tecnologia é a maior agilidade na contratação do financiamento. "Os processos antes eram muito longos e demoravam de 45 a 60 dias. Hoje, com a tecnologia, nós conseguimos aprovar as operações em dois a três dias", diz Gonçalves.
A CashMe tem hoje 600 clientes. A maior parte é formada por micro e pequenos empresários e profissionais autônomos que buscam capital de giro para a empresa. Há também pessoas físicas que usam as linhas para reforma do apartamento. Nesse caso, o tíquete médio é mais baixo da ordem de R$ 100 mil a 300 mil.
Já a Creditas opera neste mercado desde 2012. A fintech chegou a trabalhar como originador de operações de home equity para a Brazilian Mortgages e hoje oferece crédito no valor de até 60% do preço do ativo imobiliário. "Esse valor depende do cliente e da liquidez do imóvel", diz Sergio Furio, fundador e presidente da empresa.
A maior parte dos clientes (65%) é composta por funcionários com carteira assinada ou aposentados que buscam alternativas de crédito mais baratas para repagar dívidas caras. Há também o pequeno empresário que toma empréstimo na pessoa física para investir. O tíquete médio nas operações de home equity da Creditas é de R$ 160 mil. "O mercado de home equity tem potencial para chegar a R$ 200 bilhões no Brasil", diz Furio.
A crise econômica alterou o perfil desse tomador.
"Antes da crise, os clientes tomavam mais essa linha para realizar investimentos e agora o que se vê é a busca por uma troca de dívidas mais caras, como do cartão de crédito e do cheque especial, por linhas de crédito mais barata como o home equity", afirma Maria Teresa, da Bcredi.
Por contarem com garantia de um imóvel, essa linha costuma ter um custo mais barato que o crédito pessoal ou capital de giro. Na Bcredi, a taxa varia de 14% a 16% ao ano (1,0% a 1,25% ao mês) mais a variação do IGP-M. Já na Cash Me, da Cyrela, a taxa média é de 1,25% ao mês mais IPCA, e na Creditas o custo mensal varia de 1,5% a 1,50% mais IPCA.
A permissão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para a securitizadora Barigui emitir Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) com lastro em operações de refinanciamento de imóveis deve facilitar a captação de recursos por parte das fintechs. Essas empresas, por não serem bancos, não contam com a captação da poupança nem podem emitir Letras de Crédito Imobiliário (LCI) para financiar suas operações. "A emissão de CRI é uma fonte interessante de funding porque permite casar melhor o prazo de financiamento com o prazo de captação", afirma Maria Teresa, da Bcredi.
Na CashMe, a maior parte do funding também vem de captações de recursos no mercado com investidores, seja pela venda de carteira ou de CRIs.
A Creditas também emitiu R$ 23 milhões em CRI e as operações de home equity, que representam 35% da carteira de crédito total, que era de R$ 360 milhões, são financiadas integralmente pela captação de recursos via um fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC), que tem como lastro a carteira de home equity. A empresa já levantou R$ 100 milhões com o fundo e pretende fazer nova rodada de captação da ordem de R$ 25 milhões a R$ 30 milhões.