musePara museóloga Carmén Lúcia Dantas, instituições estariam à mercê de "providência divina"
 
Enquanto todo um país acompanha, ainda perplexo, a destruição de uma das mais antigas instituições culturais brasileiras - o Museu Nacional, incendiado na noite de domingo (2/9) -, uma série de perguntas já começa a surgir. O que aconteceu ali? Como se permitiu chegar a isso? Estariam outros espalhados pelo Brasil sob o mesmo risco? Em Alagoas, infelizmente sim.
 
Pelo menos é o que garante a museóloga Cármen Lúcia Dantas, principal nome da área no Estado. Graduada em Museologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, ela destaca a falta de cuidado com entidades do tipo e lembra o caso do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore, localizado na Praia da Avenida e ligado à Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
 
"Alagoas está na mesma situação ou até pior, porque aqui não se olha para os museus. O Théo Brandão foi restaurado e são quase 20 anos sem manutenção; está lá se acabando novamente. O que guarda os museus em Alagoas e no Brasil é a divina providência. Eles são amparados pela divina providência, e isso é muito triste", aponta a estudiosa. 
 
Cármen também lembra outros casos, como o do Museu Nacional. "O que houve no Rio de Janeiro pode acontecer em qualquer estado do País. Tivemos a mesma situação com o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, e com o Museu de Arte Moderna do Rio. Isso pode acontecer a qualquer museu porque eles não têm um sistema especial de segurança. São vulneráveis, todos eles".
 
Classificando o incêndio como "uma perda irreparável para o País e uma vergonha internacional", a museóloga enumera ainda as consequências para a população brasileira. "Estou profundamente chocada. As lágrimas desceram ao ver esta destruição de todo um passado. Tínhamos um museu de ciências, além do acervo museológico, documentos, teses. O museu nacional era um centro de estudos", recorda. 
 
E a especialista ressalta, ainda, a importância dos acervos guardados em solo alagoano. No Instituto Histórico e Geográfico, por exemplo, repousam algumas das mais raras peças de cultos de matriz africana no Brasil, com a Coleção Perseverança. Já no Museu do Paço Imperial, em Penedo, estão pratarias, louças, móveis e toda uma sorte de objetos utilizados por D. Pedro II durante sua passagem pela cidade.
 
"Nossos museus têm acervo rico. Alguns deles não têm uma museografia, que é a forma como se expõe esse acervo, adequada ou moderna, mas nossos acervos são preciosos tanto para a história de Alagoas, como para a brasileira. Peças valiosíssimas do culto afro, peças importantíssimas da cultura popular de Alagoas, do Nordeste e do Brasil, além de peças significativas da arte erudita, esculturas sacras, pinturas. Temos um acervo muito rico, mas altamente vulnerável".
 
Especializada em Planejamento Urbano e Patrimônio Cultural em Berlim, na Alemanha, ela garante que tudo isso corre risco. "Todos os museus de Alagoas correm risco, sejam das esferas estadual, municipal ou federal. Todos eles correm risco, e é a providência divina que os segura e preserva, apenas isso", atesta a museóloga, acrescentando que a tragédia no Rio já era esperada, haja vista a situação "caótica" das instituições. 
 
Para a museóloga, a imagem do museu em chamas é emblemática. "Ela representa o momento que o Brasil atravessa. Um País que não zela pela sua cultura, pela educação, é um país em chamas. E essa tragédia acontece exatamente no momento em que o Brasil se prepara para eleger seus representantes. Que façamos uma reflexão sobre quem vamos levar para lá. É um momento de reflexão e de dor, uma dor histórica".
 
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