
O principal atrativo conferido por esta modalidade de economia compartilhada pauta-se no oferecimento de locações extremamente curtas. É possível locar imóveis residenciais por apenas uma diária, prática anteriormente ofertada apenas por hotéis, pousadas e albergues, com acomodações a preços módicos.
Porém, como todo negócio, existem desvantagens nesse tipo de acomodação, tanto para aqueles que disponibilizam seus imóveis para tal prática e seus vizinhos, quanto para os viajantes e para o mercado. Como toda prestação de serviço, quando existe um problema que não pode ser resolvido, as partes recorrem ao Judiciário. Contudo, como tal tema é recente, inúmeras dúvidas ainda precisam ser sanadas. A principal delas reside na hora de escolher contra quem demandar em casos de problemas com a locação.
Recentemente, a 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que é aplicável o Código de Defesa do Consumidor em locações dessa forma. Os desembargadores analisaram o processo 100988-93.2017.8.26.0320, que tratou de caso envolvendo a suposta má prestação de serviço promovida contra a empresa que intermediou locação temporária. Foi feito pedido de indenização por danos morais e materiais. O depoimento foi colhido por videoconferência de testemunha que residia no exterior.
Há inúmeros processos no Judiciário paulista pleiteando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em situações semelhantes. Em outra ação (1003129-50.2018.8.26.0071), o juiz afirmou que as empresas são responsáveis caso o imóvel não esteja nas mesmas condições daquela ofertada no site.
O julgado proferido em segunda instância é o primeiro sobre o tema de má prestação de serviços. Os dois únicos acórdãos anteriores do TJ-SP (processos nº 1013838-67.2017.8.26.0011 e 1006651-04.2017.8.26.0077), tratam, respectivamente, de caso em que o consumidor recorreu para pedir majoração dos danos morais e impugnar a cobrança em dólares.
Tal impasse ocorre porque a contratação desse tipo de serviço é feita por meio de uma plataforma digital, que faz a intermediação entre o viajante e o proprietário do imóvel. Era exatamente nesse ponto que a dúvida persistia: quando o serviço for mal prestado, devo buscar a reparação em ação contra o proprietário do imóvel ou a empresa que intermediou a locação? Trata-se de relação típica de consumo ou locação que deve ser regida pela Lei de locações?
Os desembargadores do TJ paulista entenderam que aquele que contrata o serviço da intermediadora, possui condição de consumidor. Dessa forma, está favorecido pela inversão do ônus da prova. Isso significa que será desincumbido de provar suas alegações, responsabilizando a empresa intermediadora por eventuais danos causados aos consumidores, ainda que não seja a locadora. Afinal, cobra o serviço do viajante e faz a intermediação do pagamento para o locador, devendo garantir a prestação de serviço de maneira adequada.
Neste caso, entendeu ainda o juiz de primeira instância que por se tratar de relação de consumo, o viajante poderia escolher contra quem demandar, conforme previsto no Código de Defesa do Consumidor.
Com relação a possíveis alegações de que o consumidor deveria contatar o locador para solução do seu problema, sendo ele, locador, o responsável, o TJ-SP entendeu que neste caso o locador agiria como funcionário da empresa intermediadora, já que seria dela a responsabilidade. É importante ressaltar que a empresa contratada para intermediar a locação poderá buscar reparação de danos causados contra o locador.
Entretanto, caso o viajante opte por ingressar com a ação contra o locador, o Código de Defesa do Consumidor não poderá ser utilizado. Neste caso, trata-se de relação regida por lei específica, a Lei de Locações, como já pacificado pelo STJ (AgInt no REsp 1285546 / RJ), uma vez que estes contratos não possuem as características das relações de consumo.
Assim, o locador não é considerado fornecedor de serviços. Vale a reflexão sobre este tema que é recente e que ainda gera muitas dúvidas.