A aposta se confirmou. Construtoras de porte médio tomaram o lugar costumeiramente ocupado por grandes empreiteiras em obras de construção pesada, no vácuo do envolvimento delas na Lava-Jato. O primeiro sinal dessa mudança são os aeroportos de Salvador, Fortaleza, Florianópolis e Porto Alegre, leiloados em março. As operadoras que arremataram os terminais - todas internacionais - negociam a realização das obras com construtoras com receita líquida de até R$ 500 milhões, menos conhecidas nacionalmente.
A alemã Fraport está em negociações avançadas com a HTB e a Barbosa Mello, juntas em consórcio, para o aeroporto de Porto Alegre. E com a Passarelli e Método para o de Fortaleza. Nos dois casos, a operadora abriu a concorrência com altas exigências de "compliance" (regras de conformidade). Se tudo ocorrer dentro do esperado, os contratos devem ser assinados no início de 2018.
A suíça Zurich contratou a Racional para as obras do aeroporto de Florianópolis e a francesa Vinci Airports, que arrematou Salvador, mantém conversas com empresas de porte médio, brasileiras e estrangeiras. Apesar de a Vinci ter fechado, antes do leilão, um memorando de entendimento com a Queiroz Galvão que previa a prestação de serviço como EPC (sigla em inglês para engenharia, suprimentos e construção), a negociação não avançou, apurou o Valor junto a fontes de Brasília.
A engenharia completa do projeto do terminal baiano, em fase final de elaboração, está a cargo da Engecorps. A contratada pertence ao grupo espanhol de engenharia consultiva Typsa, que desenvolve grandes projetos e prestou serviço para os aeroportos de Madri e Barcelona, entre outros. Única com contrato fechado para obras nos aeroportos concedidos, a Racional atuou com a Zurich desde antes dos leilões. Levantou os investimentos necessários em cada projeto, para que a operadora fizesse as propostas na disputa.
A Racional se valeu da experiência adquirida nas obras do aeroporto de Confins, em que a Zurich é sócia da brasileira CCR no bloco privado, com 51% da concessão. Os outros 49% são da estatal Infraero. Newton Simões, presidente da Racional, explica que a principal exigência para continuidade da parceria após a vitória no leilão era que o investimento estimado durante o processo de licitação fosse igual ou menor ao desenvolvido no projeto, o que, segundo Simões, foi conseguido com sucesso. O envolvimento das grandes empreiteiras na Lava-Jato teve dois impactos para a mudança de perfil nesse leilão. Primeiramente, minou o crédito para as empresas de concessão com origem na área de construção entrarem na disputa para explorar os aeroportos. O objetivo era sempre ganhar a disputa para usar os serviços das empreiteiras coirmãs.
Foram os casos, por exemplo, do aeroporto do Galeão, que tinha a Odebrecht Transport como acionista e teve obras de expansão realizadas pela construtora Odebrecht; e de Guarulhos, cuja expansão foi tocada pela OAS, sócia na Invepar - uma das empresas que compõem o consórcio que explora Guarulhos.
O segundo efeito da Lava-Jato foi que, justamente porque as empresas brasileiras de infraestrutura não entraram na concorrência para explorar os aeroportos, as construtoras pertencentes ao mesmo grupo tiveram de competir num mercado maior. E nas mesmas condições que as empreiteiras de porte médio. A opção dos operadores de aeroportos por construtoras de porte médio foi deliberada. Os requisitos exigidos são "excelentes antecedentes, sólida capacidade de financiamento e condições de executar o contrato em tempo, forma e custo", diz uma fonte a par do assunto.
"Sem dúvida é uma oportunidade, o mercado vai sair chacoalhado. Mas acho que a maior parte dessas grandes empreiteiras deve voltar ao mercado. Eles têm uma tecnologia que não é fácil encontrar sucessão rápida no Brasil", afirma Simões. A exclusão das grandes empreiteiras é ainda mais relevante porque as obras de expansão envolvem valores altos.
Fonte: http://www.valor.com.